Jürgen Habermas pertence a Escola de
Frankfurt e como tal faz críticas à razão moderna iluminista, ou mais
especificamente, à razão kantiana, alegando tratar-se de razão monológica, ou
seja, fechada em si, subjetiva. Para vencer tal deficiência ele propõe a razão
comunicativa, aquela que dialoga e leva em consideração a intersubjetividade.
Deste modo, ele busca construir todo seu pensamento fundamentado nesta
concepção e propõe, no campo da ética, uma ética discursiva. Importa, para ele,
“recuperar a razão não repressora, mas comprometida com a vida e a emancipação
humanas” (ARANHA, 2005, p. 231).
“O conceito de razão em Habermas não
é o mesmo do iluminismo. Trata-se de uma razão comunicativa, que não existe
pronta nem acabada, mas que se constrói a partir de uma argumentação que leva a
um entendimento entre os indivíduos. É uma razão interpessoal e não
subjetiva; é uma razão processual e não
definitiva e acabada” (COTRIM, 2008, p. 255). Habermas faz uma distinção entre razão instrumental
(quando alguém egoisticamente utiliza as coisas ou pessoas como meios para
alcançar o seu propósito) e razão comunicativa (quando se recorre à
linguagem com a intenção de alcançar o entendimento sem coação).
A ética discursiva busca dar à ética um fundamento
racional através da idéia de que a reflexão sobre os pressupostos da
comunicação interpessoal permite identificar os princípios morais realmente
irrenunciáveis que devem ser a base de toda convivência humana: o reconhecimento
do outro, a não-coação da comunicação, a disposição para a solução de problemas
e a fundamentação de normas através do discurso livre e igual. Esta modalidade
ética está “fundada no diálogo e no consenso entre os sujeitos. O
que se buscaria nesse diálogo é a razão que, tendo sido reconhecida pelos
participantes do diálogo, sirva como fundamentação última para a ação moral”
(COTRIM, 2008, p. 255). Ou seja, o discurso moral deve
estender-se a todas as normas de ações passíveis de serem justificadas, ou fundamentadas
racionalmente.
Habermas afirma que “uma
moral racional se posiciona criticamente em relação a todas as orientações da
ação, sejam elas naturais, auto evidentes, institucionalizadas ou ancoradas em
motivos através de padrões de socialização. No momento em que uma alternativa
de ação e seu pano de fundo normativo são expostos ao olhar crítico dessa
moral, entra em cena a problematização. A moral da razão é especializada em
questões de justiça e aborda em princípio tudo à luz forte e restrita da universalidade.”
(HABERMAS, 1997, p. 149).
Apesar de discordar de Kant, Habermas é
considerado um universalista ético, assim como Kant o foi. Isso significa que a
ética por eles elaborada deve ter alcance sobre todos os seres racionais. Porém
em Habermas percebemos que “a forma
básica de seu pensamento é reflexiva, ou seja, autorreferente. [...] O ponto de
partida da reflexão não é – como em Kant – o pensamento solitário do indivíduo,
mas o discurso, a argumentação em comum, sempre mediatizada pela linguagem”
(HELFERICH, 2006, p. 442). Portanto, uma norma só
poderá ser considerada correta se todos os envolvidos estiverem de acordo em
dar-lhe o seu consentimento.
Desse modo, a ética do discurso tenta detectar aquilo
que nós sempre fizemos em processos comunicativos de entendimento, as
precondições e os requisitos de um entendimento bem-sucedido; busca descrever
os procedimentos do entendimento entre iguais de maneira que o resultado possa
ser considerado justo. Para a ética do discurso a abertura ao outro, a tolerância,
o respeito e o diálogo são imprescindíveis para a boa convivência no mundo
plural em que nos encontramos. A globalização e a diversidade de culturas
exigem, para que possamos viver bem na sociedade atual, que respeitemos e dialoguemos
com todos, mormente o diferente.
Referências
ARANHA,
Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Temas de Filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2005. 344 p.
COTRIM,
Gilberto. Fundamentos da Filosofia:
História e grandes temas. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
HABERMAS,
Jürgen. Direito e Democracia: entre
facticidade e validade. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 2v., 1997.
HELFERICH,
Christoph. História da Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
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